Memorial
Construir o intervalo que assegura a distância oportuna para “viver juntos” e, ao mesmo tempo, através desse intervalo configurar o nexo, o que articula. Na justa medida, na compreensão de elementos que associam e distinguem dois corpos conceitualmente definido na aporia formulada por Barthes e ensaiado em um texto ainda no prelo para o Brasil Arquitetura é que se organiza a chave para a ampliação e reforma da Galeria Nara Roesler a partir das duas casas vizinhas – a já ocupada e a de nova ocupação.
O convite para realizar a reforma da Galeria Nara Roesler vem na sequência de uma série de trabalhos com a galerista – um estande singular na SP/ARTE, uma participação de uma mesa com Guilherme Wisnik para comentar os trabalhos de Laura Vinci e Eduardo Coimbra instalados na cidade através do edital Arte na Cidade da Secretaria Municipal de Cultura sob gestão de Carlos Eduardo Calil e do texto escrito para exposição de Lucia Koch na Galeria. A proximidade levou ao desejo de que a ampliação ocorresse então no âmbito de nosso debate.
Preâmbulo necessário para entender o contexto no qual dessa arquitetura antes de tudo se estabelecem as bases para uma oportuna casa da “arte”. Projeto que para mim guarda a singularidade de um espaço que almeja permanência. Habituada a projetar espaços transitórios, temporários, esse projeto permitiu uma outra materialidade, um outro tempo de duração.
De certo modo o premissa estabelecida investiga as formas de circular seja na passagem de uma casa a outra seja no acesso que faz da cidade ao interior um acesso preservado mas aberto. A galeria está na 9 de Julho, com sua intensa e inquietante circulação viária. Como decantar esse fluxo em uma pausa?
Aproximar as duas casas vizinhas sem entretanto transformá-las em uma só casa. Essa circunstância desejável do ponto de vista legal era também oportuna do ponto de vista da gestão do espaço (a nova casa vizinha recebe exposições com outra duração e não necessariamente apenas dos artistas da galeria).
O intervalo então passa a ser o fundamental campo de operação para quem quer desenhar vizinhos oportunos – os recuos laterais agora unidos como acesso para as duas casas constituiu-se como um intervalo e um nexo. Lugar de chegada a partir do qual se define o lado inicial de visitação na perspectiva do espaço um jardim intercepta o caminho e configura uma espécie de filtro do espaço mais urbano ao mais íntimo, da rua à cozinha, como um eixo contínuo mas protegido e editado por um gradiente que vai do deck passando pelo jardim e pela biblioteca.
Eixo e vão, o elemento articulador é um jardim no qual por sua inevitável transformação a passagem do tempo é uma evidência incontornável e desejada. Convivendo em espaços estáveis, a variação da paisagem natural define o tempo em outras direções (temas caros retornam, o tempo o estável e o transitório, a cidade e a arquitetura).
Definido o nexo, constituídos novas circulações de modo a permitir um caminho oportuno entre as casas, foi então o jardim que contaminou todo o espaço. Obra de Fernando Limberger (convidado após nossa aproximação na elaboração do texto Estranhas paisagens) que propôs constituir uma grelha como pele a redefinir o “solo” de plantio (inclusive vertical) revelou-se para nós como potente paisagem a partir da qual passamos a entender como paisagem de mediação entre a cidade e a casa. Pele do jardim vira pele do espaço em uma contaminação profícua que faz com que as duas paisagens sejam agora indissociáveis. E o jardim define a justa medida entre as casas e entre a casa e a cidade.
Marta Bogéa

Premiações
2013
Prêmio O Melhor da Arquitetura
Finalista
Galeria Nara Roesler

Ficha técnica
Local
Jardim Europa, São Paulo
Projeto
2012
Obra
2012
Arquitetura
Anna Helena Villela, Marta Bogéa, Silvio Oksman
Colaboração: Liz Arakaki, Karina Kohutek
Paisagismo
Fernando Limberger
Construção
Pentágono Engenharia
Luminotécnica
Lux Projetos: Ricardo Heder
Fotografias
Leonardo Finotti
Área do terreno
2000 m²
Área construída
900 m²

Veja também

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